Entre as várias funções do departamento de Recursos Humanos (RH) de uma empresa estão as contratações e demissões. Em alguns casos, quando a falta é grave, ocorre a demissão por justa causa.

Em entrevista ao blog da Alelo, a advogada e professora de Direito do Trabalho, Daniela Jumpire, explica o que é esse tipo de demissão e quais os casos que configuram justa causa. Bora lá entender tudo?

Demissão por justa causa

Daniela explica que justa causa é a punição máxima que o empregador pode aplicar a seus funcionários pelo cometimento de uma falta grave, desde que prevista em lei.

Fazendo analogia a uma partida de futebol seria o cartão vermelho que o árbitro levanta ao jogador que resulta em sua expulsão da partida. Entretanto, para que haja a configuração da justa causa, devem ser observados os seguintes requisitos:

Gravidade do ato: precisa ser um ato que abale a confiança que o empregador tem no empregado;

Imediatidade da punição: assim que o empregador tiver ciência do ato, deve aplicar a punição, caso contrário ocorrerá o perdão tácito (não poderá mais aplicar a justa causa).

Non bis in idem: expressão que vem do latim e quer dizer “sem repetição”, ou seja, para cada falta deve ser aplicada uma punição. Exemplo: se o empregador punir o empregado com advertência ou suspensão, não poderá, em virtude do mesmo ato, aplicar a demissão por justa causa.

Proporcionalidade entre a falta e a punição: não deve o empregador aplicar justa causa no empregado, porque este chegou atrasado uma vez. Todavia, a sétima turma do Tribunal Superior do Trabalho, em 2021, manteve a decisão de justa causa a uma atendente que faltou injustificadamente ao trabalho 17 vezes no período de um ano e um mês. Isso porque, o empregador obedeceu a gradação de penalidades, ou seja, o empregado foi advertido e suspenso pelas ausências, porém continuou a faltar sem qualquer justificativa.

Teoria dos motivos determinantes: o empregador deve comunicar ao empregado no ato da dispensa o motivo da justa causa. Além disso, deve ser feito por escrito o comunicado de rescisão por justa causa, em que deve constar o fundamento, ou seja, qual alínea do artigo 482 da CLT o empregado violou.

Motivos que configuram justa causa

A Consolidação das Leis do Trabalho, em seu artigo 482, elenca os itens que podem levar a empresa a demitir o colaborador por justa causa. Bora entender cada um deles?

a) Ato de improbidade: trata-se da ação ou omissão do empregado de forma desonesta ou repleta de má-fé, no intuito de obter vantagens para si ou para terceiro. São exemplos: o furto, a adulteração de documentos, a apresentação de atestado falso, bater ponto para outro colega, entre outros.

b) Incontinência de conduta ou mau procedimento: quando o legislador definiu incontinência de conduta ele estava referindo-se a moralidade sexual no sentido de ter condutas à margem do que a sociedade espera, como, por exemplo, acessar pornografia no horário de trabalho ou colaboradores praticarem ato sexual dentro da empresa. Com relação ao mau procedimento, configura-se quando o empregado comete uma conduta irregular, faltosa e grave que não se enquadre em nenhuma das outras hipóteses mais específicas na legislação. Como exemplo de mau procedimento, temos o caminhoneiro que dirige acima da velocidade máxima permitida, haja vista que o excesso de velocidade é ato faltoso grave e configura descumprimento dos deveres e obrigações contratuais.

c) Negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço: quando o empregado desenvolve atividade paralela em concorrência com o empregador, com o objetivo de lhe tomar clientes o que consequentemente reduz o faturamento e causa prejuízo à empresa. São exemplos:

1) manicure no salão de beleza que sugere prestar o serviço na casa da cliente, pois essa além de ter desconto, estará no conforto de seu lar;

2) o empregado de uma empresa de dedetização que liga para os clientes da empresa oferecendo o valor do metro quadrado da dedetização mais em conta do que aquele oferecido pela empresa;

3) o empregado que falta ao serviço e o empregador descobre por meio das redes sociais que ele foi prestar serviço à empresa concorrente.

d) Condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena: com relação ao teor desta alínea do art. 482 da CLT, precisamos entender o que o legislador quis assegurar ao empregador e tutelar ao empregado. Por isso, vamos dividir as explicações em:

1) empregado preso com decisão transitada em julgado;

2) empregado com suspensão da execução da pena e;

3) empregado preso e livramento condicional.

Importante entendermos que enquanto o empregado estiver preso, o contrato de trabalho estará suspenso. Quando o contrato de trabalho está suspenso, não gera efeitos, ou seja, parte-se da premissa de “quem não trabalha não recebe salário”.

Todavia, a empresa precisa de documentos para comprovar que não está pagando salário, porque o contrato de trabalho do empregado está suspenso. Assim, caberá à empresa requerer à autoridade competente a certidão do recolhimento prisional.

1) Empregado preso com decisão transitada em julgado: o empregador somente poderá demitir o empregado por justa causa quando tiver em mãos o trânsito em julgado, ou seja, sentença criminal proferida pelo juiz em caráter definitivo, que não haja mais possibilidades de interposição de recurso.

Neste caso, é necessário que o empregador notifique o empregado da rescisão contratual na prisão, por meio de comunicado por escrito com Aviso de Recebimento (AR), solicitando a nomeação de procurador com poderes específicos para recebimento das verbas rescisórias.

2) Empregado com suspensão da execução da pena: para exemplificar, temos o Sursis, que tem como objetivo evitar o recolhimento do condenado à prisão. Em caso de Sursis, muito embora tenha cometido um crime, o empregado poderá continuar a realizar a prestação de serviços ao empregador e por esse motivo, não caberá a demissão por justa causa.

3) Empregado e liberdade provisória: o empregado é preso pelo cometimento de um crime, porém obtém a liberdade provisória, ou seja, ocorre a soltura.

Como o contrato de trabalho é uma via de mão dupla, pois entre empregado e empregador existem direitos e obrigações, compete ao empregado quando estiver em liberdade, reassumir a função que anteriormente exercia, sob pena de incorrer em abandono de emprego.

Observa-se que o fato que provoca a justa causa não é a condenação criminal em si, mas sim o efeito ao contrato de trabalho que é a impossibilidade da manutenção do vínculo empregatício, por falta da prestação pessoal de serviço, um dos principais elementos do vínculo de emprego.

e) Desídia no desempenho das respectivas funções: trata-se do empregado desleixado, negligente, desatento na execução dos serviços contratados. Não pode ser apenas um ato isolado para aplicação da justa causa. Exemplo: produção com considerável grau de imperfeição, abandono do local de trabalho durante a jornada, pouca produção, faltas injustificadas, atrasos reiterados, entre outros.

f) Embriaguez habitual ou em serviço: quando falamos de embriaguez, devemos diferenciar de embriaguez crônica ou ocasional.

A embriaguez ocasional é ato punível em virtude do consumo imprudente de bebida alcoólica. Caracteriza-se embriaguez no trabalho quando o empregado se apresenta para trabalhar sob efeito de álcool.

A embriaguez crônica, ou seja, o alcoolismo é considerado uma questão de saúde pública e requer tratamento e não punição.

g) Violação de segredo da empresa: referida violação precisa ser capaz de causar prejuízo à empresa, como no caso da espionagem industrial.

h) Ato de indisciplina ou de insubordinação: configura-se atos de indisciplina a violação de atos gerais da empresa, quando o empregado desrespeita as diretrizes, normas, circulares e regulamentos da empresa. Quanto à insubordinação, caracteriza-se pela violação dos atos específicos, descumprimento de ordens pessoais dada pelo empregador ao empregado.

i) Abandono de emprego: caracteriza-se sempre quando o empregado deixa de comparecer para exercer suas atividades laborais. São dois requisitos a serem preenchidos:

1) Objetivo: ausência no trabalho pelo período de 30 dias;

2) Subjetivo: a intenção do empregado em não reassumir o posto de trabalho.

Decorrido o período de 30 dias sem o empregado comparecer para exercer suas atividades laborais, o empregador deve notificar por correio com aviso de recebimento (AR) o empregado que compareça no prazo razoável, a contar do recebimento da notificação, para que reinicie suas atividades ou justifique, devidamente, o motivo que impede seu comparecimento. Caso contrário, o empregador poderá considerar a atitude como ato de renúncia do cargo, ficando o empregado demitido por abandono do emprego.

j) Ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem: atribuir a algum colaborador da empresa fato definido como crime. São exemplos:

1) Calúnia: imputação falsa de crime a uma pessoa (ex: furto, homicídio, violência contra mulher, entre outros);

2) Difamação: imputar fato a alguém que fere a reputação (ex: Fulano é caloteiro – não paga suas contas).

3) Injúria: atribuir palavras ou qualidades negativas capazes de ferir a honra subjetiva de uma pessoa (ex: proferir xingamentos).

k) Ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem: quando o empregado tece comentários de fato definido como crime contra o empregador ou superior hierárquico, tais como calúnia, difamação ou injúria.

Também pode ocorrer quando o empregado foi advertido pelo empregador e este fica magoado. Ex: o empregado resolve tirar satisfações com o seu superior fora do estabelecimento empresarial e começa a proferir palavras de baixo calão e/ou agride fisicamente seu superior.

l) Prática constante de jogos de azar: considera-se jogo de azar aqueles que o ganho ou a perda dependem exclusiva ou principalmente de sorte do empregado, como por exemplo: apostas em corridas de cavalo, em competições esportivas, jogos de baralho, entre outros.

Todavia, para que haja a caracterização, o empregado deve dedicar-se à prática de jogos de azar, realizando apostas e conferindo resultados durante o expediente de trabalho, afetando diretamente a sua produtividade laborativa.

m) Perda da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em lei para o exercício da profissão, em decorrência de conduta dolosa do empregado: em outras palavras, o empregado necessita ter cometido a falta intencionalmente ou assumido o risco de produzir o resultado. Ex: motorista profissional que, no curso do contrato, perde o direito de dirigir (suspensão da Carteira de Habilitação) em virtude de cometimento de infração de trânsito;

Como dito, a demissão por justa causa é a punição máxima que o empregador pode aplicar a seus funcionários. Em virtude disso, o empregado somente receberá a título de verbas rescisórias o saldo de salário e férias vencidas acrescidas do terço constitucional.

Além do artigo 482 da CLT, existem algumas outras formas de demissão por justa causa, como o artigo 158, parágrafo único da CLT.

O que você achou disso?

Clique nas estrelas

Média da classificação 0 / 5. Número de votos: 0

Nenhum voto até agora! Seja o primeiro a avaliar este post.