O vício em jogos de aposta, especialmente nas chamadas “bets”, é um fenômeno que cresceu de maneira exponencial no Brasil nos últimos anos.
Em 2024, os brasileiros movimentaram entre 18 e 21 bilhões por mês em apostas online, segundo dados do Banco Central, superando os valores investidos nas tradicionais loterias.
Com esse crescimento, surgiram consequências diretas para a saúde financeira da população. De acordo com um levantamento feito pelo Serasa, cerca de 73 milhões de brasileiros encontravam-se endividados ao final de 2024.
Esse cenário começa a se refletir de forma preocupante nas empresas, afetando a vida dos colaboradores e o ambiente corporativo. E nesse momento, é hora de as organizações começarem a intervir, mas qual a melhor maneira de fazer isso? Confira abaixo!
Por que as apostas viciam?
O vício em apostas está intimamente relacionado ao funcionamento do chamado mecanismo de recompensa do cérebro. Quando alguém faz uma aposta e ganha, especialmente nas primeiras experiências, há uma intensa liberação de dopamina, o neurotransmissor responsável pela sensação de prazer.
Essa “recompensa química” faz com que o cérebro associe apostar a algo positivo, criando um ciclo de reforço: o indivíduo tende a buscar repetir a experiência. E para quem está endividado, essa busca pela recompensa pode se tornar ainda mais perigosa, porque a ilusão de recuperar as perdas ou a esperança de um ganho milagroso pode agravar o vício e aprofundar os problemas com dinheiro.
O ciclo vicioso se intensifica quando a pessoa usa novas apostas como uma tentativa desesperada de resolver dívidas acumuladas, entrando em uma espiral de risco e prejuízos cada vez maiores. Além disso, o estresse financeiro pode prejudicar o julgamento racional, tornando o indivíduo mais vulnerável a decisões impulsivas e a comportamentos de jogo ainda mais arriscados.
A influência dos algoritmos
Muitas casas de apostas utilizam algoritmos e estratégias que dão a impressão de facilidades e ganhos iniciais, fazendo com que o novo apostador tenha pequenas vitórias logo nos primeiros jogos.
Esse “lucro inicial” é decisivo para o vício: ele gera confiança e a ilusão de que ganhar é fácil ou até frequente, incentivando apostas maiores ou mais frequentes. Ao longo do tempo, porém, as probabilidades reais do jogo, desenhadas para garantir a lucratividade da casa de apostas, entram em ação, e o jogador começa a perder mais do que ganha.
Esse ciclo, alternando momentos de ganhos rápidos com sucessivas perdas, é planejado para manter o apostador engajado e confiante no retorno fácil. O cérebro, já condicionado pela expectativa de recompensa, sente dificuldade em controlar o impulso de continuar apostando, mesmo diante de prejuízos financeiros e emocionais.
Esse padrão é o que propicia o desenvolvimento de dependência em apostas (ludomania) e maximiza os prejuízos na vida dos envolvidos.
Sinais de alerta no ambiente corporativo
O vício em apostas pode se manifestar de diferentes maneiras no local de trabalho. Entre os principais sinais de alerta, destacam-se:
- Queda de produtividade e desatenção frequente;
- Atrasos e faltas recorrentes (absenteísmo);
- Manifestação de ansiedade, irritabilidade ou isolamento social;
- Discussões frequentes envolvendo dinheiro ou pedidos de adiantamento salarial;
- Mudanças bruscas no comportamento e evasão de responsabilidades;
- Em casos extremos, envolvimento em fraudes, desvios financeiros para sustentar o vício e pedidos de empréstimos financeiros entre os colaboradores.
Departamentos de RH e lideranças atentas a esses indicadores podem intervir mais cedo e evitar problemas graves tanto para o colaborador quanto para a organização.
Qual o maior impacto que os vícios em apostas podem causar?
Conforme explica Wellington de Andrade, professor do Curso de Administração e Recursos Humanos na Universidade Guarulhos (UNG), o vício em qualquer tipo de aposta, principalmente nas bets, pode prejudicar muito o desempenho das equipes, especialmente quando falamos de aspectos que envolvem trabalho em equipe para alcançar metas e objetivos.
“Os colaboradores viciados em apostas têm seu desempenho comprometido e, consequentemente, uma queda na produtividade. Eles também podem apresentar um alto índice de absenteísmo e de problemas disciplinares. Os problemas financeiros ocasionados pela ludomania na vida pessoal geram estresse e desequilíbrio emocional que refletem nas relações interpessoais no ambiente de trabalho.”
Para o professor, esse problema acaba gerando desafios ao clima interno, como insatisfação com o trabalho e uma repentina necessidade de aumento ou de mudanças drásticas na remuneração.
“Colaboradores viciados em jogos tendem a estar mais endividados, por isso, muitas vezes entendem que seus ganhos são insuficientes para resolver suas dificuldades financeiras, levando a pedidos de aumento salarial, insatisfação, e até mesmo solicitando demissão como forma de tentar resolver o problema financeiro.”
Ele explica que esses comportamentos normalmente são percebidos pela equipe e pelos pares, o que prejudica a harmonia e o equilíbrio do ambiente de trabalho.
A importância do fator humano
O papel do RH é fundamental na intervenção e auxílio de colaboradores com problemas de vício em apostas. É preciso enxergar o colaborador como indivíduo em sofrimento, não como alguém a ser punido.
O estigma em torno da ludomania dificulta a busca por ajuda, tornando essencial uma atuação acolhedora e livre de julgamentos. Uma escuta ativa, empática e sem preconceitos auxilia na identificação precoce do problema e na criação de um ambiente seguro para que o tema seja discutido abertamente.
Wellington ressalta que o time de recursos humanos pode desempenhar um papel fundamental para reduzir esses problemas, trabalhando ações internas voltadas para conscientização por meio de campanhas, palestras com psicólogos ou consultores, e dinâmicas de grupo abordando o problema, sempre de forma coletiva, sem individualizar o problema para não causar constrangimentos ou expor quem está enfrentando o vício.
“Também é possível desenvolver programas de educação financeira, tanto para auxiliar os colaboradores em relação à economia doméstica e familiar quanto destacando os perigos relacionados às apostas.”
O RH deve atuar como agente de apoio, promovendo o respeito e o cuidado humano, sem reforçar o isolamento do dependente, oferecendo apoio psicológico e orientando os profissionais.
Por que apostar em programas de apoio pode ser mais eficiente do que a demissão imediata
Optar pela demissão de colaboradores afetados pelo vício, não resolve o problema, pode criar uma cultura de medo e esconder ainda mais o tema. Por isso, programas de apoio bem estruturados apresentam vantagens claras:
- Redução de custos com turnover e treinamento;
- Preservação do capital humano e do clima organizacional;
- Melhora do engajamento e produtividade dos colaboradores recuperados;
- Fortalecimento da imagem e reputação da empresa como promotora de bem-estar.
Oferecer caminhos de tratamento e reintegração é, muitas vezes, mais eficiente e humano do que medidas punitivas imediatas.
Políticas e práticas de apoio nas empresas
As empresas podem desempenhar um papel fundamental na prevenção e no combate ao vício em jogos de azar e outros problemas ao implementar políticas e práticas de apoio bem estruturadas.
Isso inclui ações como sensibilização e treinamento para líderes e equipes, garantindo que todos estejam conscientes dos riscos e saibam como identificar sinais de alerta.
Além disso, é importante estabelecer canais de comunicação seguros e confidenciais, onde os funcionários possam fazer denúncias ou pedir ajuda sem medo de represálias.
Ações de auxílio a profissionais viciados em apostas
Oferecer apoio psicológico e programas de assistência ao funcionário, assim como parcerias com clínicas especializadas ou grupos de apoio externos, pode ser decisivo para quem precisa de tratamento.
A flexibilidade para afastamentos temporários também é essencial, permitindo que o colaborador se dedique à recuperação sem perder o vínculo empregatício. Outro aspecto importante é o reforço no compliance e nos mecanismos de controle interno, reduzindo oportunidades para fraudes ou comportamentos de risco.
No entanto, mais do que medidas isoladas, o sucesso dessas iniciativas depende da construção de um ambiente acolhedor, onde o colaborador se sinta seguro para compartilhar suas dificuldades e buscar ajuda quando necessário.
Dessa forma, as empresas protegem a saúde de seus funcionários e fortalecem a cultura organizacional e a sustentabilidade do negócio.
O efeito do vício em apostas na saúde
As consequências da ludomania ultrapassam o âmbito privado do indivíduo. O endividamento, comum a quem enfrenta este tipo de compulsão gera sofrimento emocional intenso, agravando quadros de ansiedade, depressão e estresse, afetando a vida familiar.
É comum, em casas sustentadas por pessoas viciadas em jogos de aposta, faltar o básico, já que, em muitos casos, o dinheiro que deveria ser utilizado para contas fixas, acaba sendo destinado às bets.
De acordo com a B3, cerca de 86% dos apostadores acumulam dívidas e 64% estão negativados no Serasa. O vício leva o indivíduo a destinar grande parte ou até toda a renda disponível para apostas, em detrimento de despesas essenciais, como alimentação, água, energia elétrica e aluguel.
Na esfera corporativa, o reflexo pode ser percebido a partir do declínio do desempenho, absenteísmo, conflitos internos, piora da saúde mental e impacto negativo no clima organizacional.
Em casos mais graves, aparecem riscos à empresa e aos colegas de trabalho. Por isso, lidar com o problema é uma questão de saúde integral e de sustentabilidade para o negócio.

Como preparar líderes e equipes?
A preparação de líderes e equipes exige atuação em duas frentes:
- Treinamentos sobre identificação de sinais, comunicação não violenta e abordagem empática;
- Divulgação de informações que desmistifiquem a ludomania e reduzam o estigma.
Líderes bem preparados são aliados valiosos na detecção precoce e encaminhamento assertivo de situações de risco, sempre preservando a dignidade do colaborador e a integridade do ambiente de trabalho.
Quando (e como) a demissão deve ser considerada
A demissão, embora possa ser necessária em alguns casos, como envolvimento comprovado em fraudes ou riscos irreparáveis à empresa, deve ser a última alternativa.
Antes de optar pelo desligamento, esgote as alternativas de recuperação: orientação, acolhimento e acompanhamento profissional.
Caso o desligamento seja inevitável, conduza o processo com respeito, oferecendo, se possível, encaminhamento para redes de apoio externas. O cuidado ético e humano deve permanecer até o final do vínculo.
Colocar o fator humano no centro da política de enfrentamento do vício em apostas, especialmente via RH, representa um avanço na construção de ambientes organizacionais mais saudáveis, resilientes e sustentáveis.
Como os benefícios corporativos podem auxiliar
A busca por um ambiente de trabalho saudável e seguro vai além de salários atrativos: envolve promover o bem-estar físico e emocional dos colaboradores, especialmente em casos de vícios, como a compulsão por apostas. Nesse contexto, os benefícios corporativos podem ser aliados estratégicos, direcionando recursos para necessidades específicas.
Ao oferecer auxílios como vale-alimentação, saúde e educação, as empresas garantem que o valor do benefício seja usado de forma consciente, fortalecendo a segurança financeira e alimentar do colaborador.
Empresas comprometidas com essa causa podem contar com a Alelo, que oferece soluções flexíveis e personalizáveis, como o Alelo Pod, permitindo que os recursos sejam destinados à alimentação, saúde, educação e bem-estar, reduzindo o impacto causado por comportamentos de risco, como as apostas.
Escolher a Alelo significa investir em um pacote de benefícios inteligente, que protege o colaborador, promove qualidade de vida e reforça a cultura organizacional com a segurança de uma líder de mercado.
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