Que impacto o novo coronavírus deixará para a humanidade? É difícil dar uma resposta rápida, mas é possível dizer que tudo vai mudar. “Está cada vez mais claro que nossa era será definida por um cisma fundamental: o período anterior ao Covid-19 e o novo normal que emergirá na era pós-viral: o “próximo normal”, declara relatório feito pela consultoria empresarial americana McKinsey. Nessa fase pós-viral, o estudo propõe que os líderes empresariais atuem em cinco estágios pós-pandemia Covid-19: resolução, resiliência, retorno, reimaginação e reforma.
Para o historiador, professor universitário e escritor israelense Yuval Noah Harari, as decisões que os governos e as pessoas tomarem nas próximas semanas irão provavelmente moldar o mundo pelos próximos anos. Em artigo para o jornal inglês Financial Times, o autor de best-sellers como “Sapiens – Uma breve história da humanidade”, que já foi traduzido para mais de 45 idiomas, acredita que a mobilização global provocada pela pandemia irá moldar não apenas os sistemas de saúde, mas também a economia, a política e a cultura. “Devemos agir de forma rápida e decisiva”, diz. Segundo Harari: “A tempestade passará, a humanidade sobreviverá, a maioria de nós ainda estará viva — mas habitaremos um mundo diferente”.
Diferente nas formas de trabalhar, estudar e comprar, por exemplo. Tudo – ou quase tudo pós-pandemia Covid-19 – poderá ser feito a distância. Se antes havia certa resistência a essa ideia, a forma como o mundo está “se virando” é uma prova de que as práticas virtuais podem trazer bons resultados. “O que acontece quando todo mundo trabalha de casa e se comunica a distância? O que acontece quando escolas e universidades inteiras ficam online? Em tempos normais, governos, empresas e conselhos educacionais nunca concordariam em realizar tais experimentos. Mas esses não são tempos normais”, afirma o israelense.
Não por acaso o indiano Rohit Bhatgava, que faz previsões do futuro, incluiu o home-office, o ensino a distância, os restaurantes fantasmas (que não têm lojas físicas e funcionam apenas com entrega a domicílio) e a entrega por drones entre as 10 tendências que caminham para se tornar realidade. Fundador da Non-Obvious Company, Bhatgava publica há dez anos o livro “Non-obvious”, com uma lista do que vai atrair a atenção dos consumidores, para guiar empresários e empreendedores no desenvolvimento de negócios.

Ensino remoto cresce de modo inesperado e exige ajustes

O ensino por meio de ferramentas virtuais não é algo novo. A Khan Academy, organização sem fins lucrativos americana que oferece educação gratuita por meio de vídeos online, por exemplo, foi fundada há 12 anos, recorda Bhatgava. Cursos do ensino superior a distância tampouco são novidade. Mas na educação básica a prática até então não era comum e tem levado pais, professores e alunos a repensar o próprio sistema educacional.
Segundo o monitoramento da Unesco, mais de 150 países implementaram o fechamento de escolas, impactando em mais de 80% da população estudantil mundial. São cerca de 290 milhões de crianças e jovens por todo o planeta que pararam de frequentar escolas e estão estudando de casa, segundo a entidade.
Para dar continuidade ao aprendizado, escolas e professores enfrentam uma verdadeira maratona para produzir aulas gravadas e “ao vivo”, aderir a plataformas online, preparar e corrigir exercícios e dar retornos aos pais por meio de instrumentos como e-mail e WhatsApp. “Manter as atividades educacionais durante o período em que se está em casa é crucial para minimizar os prejuízos da ausência das aulas presenciais. A dúvida de professores, especialistas e sociedade é como fazer isso”, afirma Priscila Cruz, presidente-executiva e cofundadora da organização não-governamental Todos pela Educação.
Muitas famílias de escolas particulares têm se queixado da quantidade de atividades enviadas às crianças que, principalmente no ensino infantil e na educação fundamental, exigem suporte dos pais na realização das tarefas. Embora eles vejam como positivo o fato dos filhos terem de estudar boa parte do dia, alguns reclamam que não estão dando conta das demandas escolares das crianças, às quais se somam o trabalho remoto e as atividades domésticas.
Enquanto algumas escolas já realizavam tais práticas, ainda que em menor escala, outras tiveram que se adaptar às pressas para dar conta da nova realidade. Muitas instituições, inclusive, anteciparam as férias de julho ou pretendem fazê-lo agora em maio como medida para se preparar melhor ao ensino remoto. Nas redes públicas de ensino, questões sociais e tecnológicas são o principal desafio. “É importante mitigar as condições heterogêneas de acesso em função da realidade dos estudantes”, diz a presidente da ONG.
Apesar dos dilemas, a nova realidade tecnológica implementada de maneira inesperada tem se mostrado uma grande oportunidade para mudanças no ensino futuro.

Trabalho home office, ferramentas e serviços digitais tendem a crescer pós-pandemia Covid-19

Se a prática do trabalho remoto já era realidade em muitas empresas, se tornou ainda mais intensa neste período de isolamento social. As apresentações e as conferências virtuais têm sido frequentes entre os colaboradores. Há em curso uma tentativa de manter em casa tudo o que se fazia no escritório. Talvez esse não seja o melhor caminho, mas não há dúvidas de que com menos interrupções e mais concentração – a depender da pessoa – o trabalho remoto pode funcionar bem.
E nesses novos moldes de trabalho e ensino, ferramentas não tão novas assim como Skype, Whereby, FaceTime, Zoom, Google Hangouts. Slack dentre outras novidades têm papel fundamental. Elas ajudam não só a se conectar com o time do escritório, mas têm sido usadas para  “encontros” familiares; por profissionais autônomos como terapeutas, que passaram a realizar atendimento online; e mesmo por empresas na tentativa de seguir ofertando seus serviços aos clientes. É o caso da Gympass, rede de academias presente em 14 países, como Itália, Espanha e Estados Unidos, que estão entre os mais atingidos pelo coronavírus. A toque de caixa, a organização lançou um aplicativo com modelos de exercícios e dicas de nutrição e meditação, por exemplo, e criou uma plataforma de aulas ao vivo. O objetivo, além de se mostrar presente na vida de seus clientes, é obter receita por meio das aulas digitais. “Não existe referência para o que a gente está vivendo. Vamos sempre avaliar e ajustar rápido”, disse Leandro Caldeira, presidente da Gympass no Brasil, à CNN Brasil.

Compras de alimento sem sair de casa – e uma relação de confiança maior entre as pessoas

Setores como o de entretenimento, restaurantes, turismo e varejo de roupas e calçados estão entre os mais afetados pela crise. Mas há serviços como os de supermercado e restaurantes que viram na crise uma oportunidade e dispararam as vendas. Compras personalizadas, entrega em casa e um relacionamento contínuo do consumidor com as lojas são tendências já em prática que muitos negócios estão explorando. O estabelecimento que ainda não aderiu ao digital, corre para fazê-lo e contrata às pressas programadores e webdesigners para criar páginas de e-commerce. Alguns estabelecimentos começam a fazer CRM (Customer Relationship Management), para melhorar o relacionamento com o cliente, fazendo o negócio funcionar por meios diferentes dos tradicionais. E um sentimento de confiança se destaca na relação cliente-consumidor. Pagamentos antecipados de serviços como manicure, compra de voucher em restaurantes para uso no futuro, e a compensação do tempo não utilizado na academia de ginástica, que poderá ser reaproveitado quando tudo voltar “ao normal”, são alguns exemplos que mostram que quando as pessoas confiam nos negócios, elas investem neles mesmo sem receber de imediato algo em troca.
O escritor israelense Yuval Noah Harari também ressalta a importância, neste momento, de resgatarmos a confiança na ciência, nas autoridades públicas e na mídia. E de mantermos um espírito de cooperação e confiança global para que os países compartilhem informações de maneira aberta e humilde para “superar, com o menor estrago possível, uma crise desta proporção — e desse ineditismo”, diz ele. Nessas horas, até aquela discussão amarga que você teve com o irmão perde força. “Quando ocorre uma emergência, você descobre subitamente um reservatório oculto de confiança e amizade e se apressa para ajudar ao outro”, declara o escritor. Ele avalia que em um momento de crise, as mentes podem mudar depressa. Já estão mudando, na verdade, e tem que ser para a melhor. É o que se espera.

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