O convívio de pessoas de diferentes idades em um mesmo ambiente de trabalho nunca foi tão intenso quanto atualmente. Do colaborador sênior ao estagiário, hoje ao menos quatro gerações coexistem nas empresas: os chamados Baby boomers (1945 a 1965), a Geração X (1965 a 1980), os Millennials (1981 a 1996) e a Geração Z (1997 a 2010).

Ou seja, pela primeira vez, indivíduos nascidos em intervalos de tempo tão amplos, com diferentes valores, atitudes, expectativas e comportamentos, dividem o mesmo escritório.

No entanto, mesmo com esse caldeirão geracional disponível no mercado de trabalho, o resultado pode ser a falta de diversidade etária nas empresas e, em casos mais severos, o etarismo, um termo utilizado para descrever o preconceito que ocorre em função da idade.

Essa discriminação, baseada em estereótipos, costuma atingir principalmente pessoas com idade mais avançada. Pelo menos 86% dos trabalhadores acima dos 60 anos afirma já ter enfrentado algum tipo de exclusão em relação ao mercado de trabalho, independentemente de suas habilidades e experiências, segundo pesquisa realizada pelo Grupo Croma, com base em dados da Oldiversity. 

O colaborador discriminado e visto com desconfiança por colegas e gestores, acaba por ter poucas chances de integrar os quadros de liderança da empresa.

Mas o etarismo e a falta de diversidade etária no contexto corporativo impactam negativamente a empresa também, em pontos como: perda de experiência e conhecimento, baixa retenção de talentos, ambiente tóxico, diminuição da inovação, problemas de reputação da empresa e dificuldade em pontos como diversidade e inclusão.

Por isso, gestores e equipes de Recursos Humanos precisam se conscientizar que absorver toda essa gente diversa ao mesmo tempo é primordial para a construção de um ambiente dinâmico e inovador.

Para entender como conflitos geracionais não estão com nada e que trabalhador competente é competente com qualquer idade, a gente ouviu especialistas que colocaram a necessidade das organizações promoverem a integração, inclusive em benefício delas próprias.

Bora lá?

Integração entre diferentes gerações

Apostar em pluralidade de gerações dentro de uma empresa vai muito além de contratar pessoas de diversas idades e distribuí-las por cargos para que trabalhem juntas. As organizações precisam respeitar etapas e processos para que essa integração seja bem-sucedida. 

Sócia da Acalântis Services e expert em diversidade etária e etarismo, Fran Winandy explica que antes de realizar contratações de colaboradores de diferentes gerações, é necessário fazer um balanço da variedade etária da organização.

“Uma empresa onde só tem jovens, aí se coloca lá um grupinho de pessoas com mais de 50 anos. Quando se percebe, seis, sete meses depois, essas pessoas não estão mais na empresa. Porque o lugar não foi preparado para receber essas pessoas que estão entrando. Então, é um trabalho complexo, onde se atua em várias frentes para que aquilo dê certo”, continua Fran.

Head de Novos Negócios da Maturi, Andrea Tenuta coloca que é preciso tomar cuidado para não reforçar estereótipos geracionais durante o processo de integração, e que deve haver o entendimento aberto de um propósito na conexão entre os colaboradores de diferentes idades.

“Quando falo de intencionalidade, é entender o que cada geração representa dentro daquele universo. Porque uma geração é diferente de uma empresa para outra, pela própria representatividade. Então a integração nada mais é do que um grande mosaico de talentos. Saber gerir essas pessoas e fazer uma orquestra incrível. Não tem receita de bolo e em cada organização vai mudar”, ressalta Andrea. 

Diálogos intergeracionais

Para uma empresa ter diversidade etária é preciso atitudes práticas e não ficar apenas no discurso de que é um “ambiente inclusivo para todas as pessoas”. Entender quem são essas pessoas é o primeiro passo para promover esse ambiente intergeracional.

Ao utilizar o conceito de diálogos intergeracionais, Andrea Tenuta refuta o termo “choque” no encontro entre indivíduos de gerações diferentes.

“Cada geração é diferente, então tem sim uma questão cultural. Mas não é só por ser um ambiente mais jovem ou mais tradicional que vai ser mais aberto. Primeiro é preciso entender os números e seja qual for a cultura da empresa, dá para se trabalhar essa integração, sabendo transitar dentro da realidade de cada empresa”, explica a Head da Maturi.  

“Essa integração se dá nas mínimas atividades do dia a dia de gestão de pessoas. Seja em uma mentoria intergeracional, nos treinamentos, na contratação, no employer branding, enfim, em todas as etapas.”

Superar o etarismo é vantajoso para empresas

Empresa mais inovadora e produtiva

A cultura da contratação de pessoas com 50+ passa ainda por um caminho longo e complicado na grande maioria das empresas e organizações.

Segundo pesquisa da Ernst & Young em parceria com a agência Maturi, 78% das empresas brasileiras consideram-se etaristas e veem barreiras para contratação de trabalhadores nessa faixa de idade.

Então como convencer um empresário que tem receio em contratar profissionais de diversas gerações e colocá-los em um mesmo ambiente de trabalho?

Fran Winandy explica que o etarismo é um preconceito de idade e que pode estar voltado para qualquer faixa etária, principalmente para quem já passou do meio século de vida. 

Ela ressalta que pelo fato do Brasil ser um país formado por uma maioria de jovens, as empresas têm essa cultura de dar mais espaço a pessoas mais novas, porém a pirâmide etária do país vem mudando e essa participação profissional das pessoas mais velhas é o reflexo do que está acontecendo no Brasil hoje.

“As pessoas estão tendo menos filhos, estão envelhecendo mais e esse reflexo se dá dentro das organizações também. Esse é o letramento que tem que ser feito junto às lideranças para que elas entendam que a pirâmide está mudando, que vai ter menos jovens, as pessoas vão viver mais e por isso tem que trazer para as organizações pessoas com mais de 50 anos”, aponta Fran. 

Não aproveitar uma equipe com várias gerações é algo que é um desperdício inclusive sobre as oportunidades econômicas que a empresa deveria aproveitar, garante Andrea Tenuta.

Segundo ela, estudos e pesquisas mostram que equipes com a presença de colaboradores de várias gerações são extremamente mais produtivas e com melhores resultados financeiros.

“Para quem tem receio de contratar pessoas mais velhas, eu digo que está com o dinheiro parado na mesa. Porque, ao não ter times multigeracionais, a empresa deixa de ser mais inovadora e produtiva, pois todos os indicadores de gestão de pessoas e do negócio melhoram. Essa intersecção é muito rica”, alerta. 

Andrea Tenuta, Head de Novos Negócios da Maturi

“Uma pessoa com 50, 60 ou 70 anos não é menos inovadora, menos tecnológica ou mais devagar. Tudo isso são preconceitos que as pessoas tendem a ter. Basta olhar números e indicadores. Todos os times que têm diferentes gerações são mais produtivos, criativos e inovadores, tanto sob a ótica interna quanto para atender o mercado. Então, para quem tem receio da ideia, eu repito: mude, porque tem dinheiro parado na mesa”, continua Andrea Tenuta, Head da Maturi.

É preciso educar a empresa

A criação de um ambiente colaborativo que promova a troca de conhecimentos entre diferentes gerações passa pelo RH, que deve promover a conscientização dos colaboradores e da gestão como um todo.

Andrea Tenuta explica que o tema etarismo ainda não está no repertório da maioria das pessoas, e o conceito é um pouco distorcido, pois muitos não sabem que ele serve para além das pessoas mais velhas, atrapalhando também os jovens que estão em início de carreira. 

O RH tem um papel muito de educar, de trazer essa pauta sempre que possível. Não necessariamente somente em um recorte da diversidade etária, geracional, e sim em todos os ambientes, situações e ecossistemas que o RH estiver trilhando”, afirma.

Já Fran Winandy coloca que a inclusão deve ultrapassar a questão geracional, mas chegar a todos os tipos de diversidade.

“As pessoas que se sentem incluídas dentro da empresa, que têm esse senso de pertencimento, produzem mais, trabalham melhor e são mais felizes. Tudo isso traz melhores resultados para a empresa”, conta a especialista.

O combate ao etarismo no ambiente de trabalho passa também por puxar as lideranças para dentro dessa conversa, “porque muitas vezes a própria liderança que está nessa faixa de idade é preconceituosa com as demais pessoas”, alerta Andrea.

“O papel do RH é trazer luz ao tema e não só sensibilizar, mas instrumentalizar, dar munição para as pessoas saberem combater esse etarismo, porque é um trabalho de formiguinha e é uma jornada contínua, não vai ser um post, uma palestra, um evento sobre o tema que vai gerar essa transformação”, continua a representante da Maturi. 

RH precisa ficar “de olho nos sinais”

Além de colocar o assunto etarismo e diversidade etária na pauta do dia, outro papel do RH é estar ligado aos menores sinais de que o preconceito por idade se instalou dentro da empresa.

É o que explica a psicóloga e especialista em Desenvolvimento Humano e Organizacional, Bia Nóbrega.

“O etarismo pode se manifestar de formas sutis, como: piadas, apelidos ou comentários depreciativos sobre a idade de uma pessoa colaboradora, a exclusão de projetos inovadores sob o pretexto de que ‘não se adaptam a novas tecnologias’, ou até mesmo a falta de oportunidades de carreira, treinamento e desenvolvimento”, pontua Bia.

Um ambiente de trabalho onde as pessoas não são respeitadas somente por ter uma idade mais avançada, continua a psicóloga, tem tudo para afetar a saúde mental e o bem-estar dos colaboradores, agravando sensações como inadequação e isolamento que elas já enfrentam fora do trabalho.

Sentirem-se subestimadas ou desvalorizadas em um ambiente onde deveriam se sentir úteis e respeitadas pode levar ao aumento da ansiedade, baixa autoestima, e até depressão. Esse impacto negativo na saúde mental pode comprometer o desempenho profissional e a motivação”, explica.

Não é só uma “brincadeirinha”

O fim do etarismo passa principalmente pelo fim de atitudes que, à primeira vista, parecem inofensivas, como “brincadeirinhas”, mas que acabam abalando profundamente as pessoas mais velhas. 

Por isso, ao receber uma denúncia de etarismo entre colegas, mesmo que tenha sido algo “bobo” para um dos lados, é preciso agir. 

“A abordagem deve sempre ser baseada no respeito e na empatia. É essencial criar um ambiente seguro para essa conversa, explicando que, mesmo sem a intenção de ofender, certas piadas ou comentários podem ser percebidos como desrespeitosos”, indica a psicóloga.

Na conversa, é importante reforçar os valores da organização e distinguir entre um ambiente leve e humorado, e um onde brincadeiras ou apelidos podem ofender alguém.

“Mostrar como essas atitudes podem impactar o ambiente de trabalho e o bem-estar de todos pode ajudar o colaborador mais jovem a entender a importância de se comunicar de maneira mais consciente, cautelosa e respeitosa”.

Trabalho colaborativo e troca de experiências

A promoção de um ambiente inclusivo começa com a conscientização, a educação e uma política clara de combate ao preconceito etário.

Uma ação interessante para criar laços entre gerações, segundo Bia Nóbrega, são programas de mentoria, tanto reversa, onde profissionais mais jovens mentoram os mais velhos, quanto tradicional, onde profissionais mais experientes supervisionam os menos experientes.

Bia Nóbrega. psicóloga e especialista em Desenvolvimento Humano e Organizacional fala sobre etarismo

“Além disso, são eficazes atividades que incentivem o trabalho colaborativo e a troca de experiências, assim como rodas de conversa sobre o tema. Também é fundamental que a liderança atue como exemplo, valorizando as contribuições de todos os colaboradores, independentemente da idade”, completa a psicóloga Bia Nóbrega.

Grupo Gerações da Alelo

O combate ao etarismo e a valorização da convivência entre diferentes gerações com respeito e singularidades de cada um e busca a inclusão de pessoas 50+ são questões discutidas dentro da Alelo por meio do Grupo de Afinidades Gerações.

Cesar Caires Camacho, da Veloe e Colíder do grupo, conta já ter sofrido um desligamento em uma outra empresa, quando tinha apenas 47 anos. 

“Eu mesmo ouvi, no dia em que fui desligado do meu antigo emprego: ‘Você já está cansado. Não entrega mais como entregava. Não entrega na velocidade que a gente precisa’”, relembra.

O principal desafio enfrentado por profissionais mais velhos ao tentar se inserir ou se manter no mercado é justamente o preconceito, alerta Cesar.

Gestores costumam achar que os mais velhos não estão atualizados com as novas tecnologias e tendências do mercado, ou que ainda não vão conseguir se adaptar a novas metodologias e ferramentas, mesmo sendo óbvio que esse tipo de conhecimento pode ser adquirido com treinamento. 

Cesar também aponta a questão das empresas vê-los como alguém com mais problemas de saúde e acha que isso pode gerar algum tipo de “prejuízo” no futuro.

“Há, ainda, a questão do salário, em que pode haver a impressão que os profissionais mais velhos possam exigir um salário maior e os mais jovens acabam sendo um investimento mais atrativo às empresas”, analisa.

Para ele, a combinação de gerações é um trunfo e pode levar a soluções mais criativas. 

“Enquanto um profissional mais velho pode identificar um problema mais rápido, devido a sua bagagem profissional, o mais novo pode inovar na solução daquele problema e resolvê-lo de maneira mais rápida e eficiente”, argumenta.

“Com essa mistura as empresas só ganham, pois podem criar um ambiente de trabalho mais inovador, acolhedor e respeitador, podendo fazer com que as pessoas se sintam mais satisfeitas e seguras no ambiente de trabalho. É um ambiente perfeito onde o mais velho passa sua experiência de vida e o mais novo passa sua experiência, por exemplo, tecnológica”.

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