Inspiração e direcionamento são palavras cada vez mais ligadas à importância dos líderes em uma empresa. O modelo de gestão tradicional, hierárquico e centrado no “chefe que manda e os outros obedecem”, vem dando espaço para lideranças mais humanizadas e colaborativas, de líderes mais bem afinados com os novos tempos em relação ao que se entende sobre a construção de uma carreira.
Uma liderança forte possibilita maior engajamento dos colaboradores, consegue traduzir ao time a respeito do propósito da empresa, identifica talentos e assume a responsabilidade em decisões estratégicas e operacionais, equilibrando riscos e oportunidades.
Mas muito tem se discutido sobre um possível “apagão de líderes”. Dados e pesquisas demonstram que o mercado de trabalho está diante de um declínio no interesse das pessoas em assumir funções de liderança, além de não apresentarem a qualidade necessária para isso, a chamada liderança acidental.
Segundo pesquisa da plataforma canadense Visier, 4% dos profissionais desejam ser líderes, uma queda significativa comparada aos 7% registrados em 2014. Já dados de um estudo da CoderPad, plataforma de contratação de desenvolvedores, identificou que 36% dos profissionais entrevistados da Geração Z não têm intenção de assumir responsabilidades gerenciais.
Uma pesquisa anual do Boston Consulting Group (BCG) revela que a falta de profissionais capacitados no mercado preocupa 71% dos líderes de RH no Brasil. Então, se é assim, não há dúvidas: é preciso formar líderes. E quem melhor que o RH para agilizar o mapeamento e identificar potenciais lideranças?
Para um bate-papo sobre o papel dos Recursos Humanos na formação de líderes, convidamos Marcela Zaidem, palestrante e founder da consultoria CNP People Solutions, e Fernanda Bueno, consultora e Head de T&D da consultoria Across.
Bora lá?
Sucessão para cargos de liderança: como o RH deve contribuir?
A construção de planos de sucessão para cargos de liderança tem no RH um ator fundamental.
Mas em primeiro lugar é preciso entender que a identificação de talentos internos que, mesmo sem acesso à educação formal, apresentam potencial para ocupar posições de gerenciamento, ganha relevância no atual formato do mercado de trabalho.

“O RH não pode mais ser apenas um executor de processos. Ele precisa ser protagonista na formação da próxima geração de líderes.”
Marcela Zaidem, palestrante e founder da consultoria CNP People Solutions
Segundo Marcela, construir planos de sucessão não é apenas mapear cargos e candidatos, mas antecipar os desafios do negócio e preparar pessoas que realmente possam impulsionar resultados.
“Muitas vezes, a liderança se revela na prática: quem consegue tomar decisões estratégicas, inspirar equipes e lidar com complexidade pode superar qualquer diploma. O papel do RH é descobrir, desenvolver e acelerar esse potencial, garantindo que a empresa não dependa apenas de títulos, mas de capacidade de liderança real”, argumenta.
Para Fernanda Bueno, a identificação e desenvolvimento de líderes, independentemente de credenciais formais, representa o futuro do RH estratégico: mais humano, inclusivo e eficaz.
“Esta abordagem integrada de sucessão e desenvolvimento reflete as tendências mais atuais em People Analytics, Employee Experience e Future of Work, posicionando o RH como verdadeiro parceiro estratégico do negócio”, salienta.
Fernanda acredita que planos de sucessão precisam ser fundamentados em skills futuras, não somente na experiência passada, contemplando diferentes perfis e trajetórias profissionais que se conectem aos objetivos de longo prazo da organização.
“Organizações que priorizam mobilidade interna têm 41% maior retenção de talentos e 70% maior engajamento”, diz, parafraseando o relatório de 2024 da Deloitte Human Capital Trends.
Competências comportamentais têm o mesmo peso da formação profissional?
Entre os critérios para avaliação de candidatos à sucessão de liderança, as soft skills e competências comportamentais hoje em dia são tão importantes quanto cursos e diplomas.
“Soft skills e competências comportamentais não são complementares: são determinantes. Resiliência, inteligência emocional, capacidade de comunicação, visão sistêmica e postura de dono do negócio definem se alguém será capaz de liderar de verdade”, aponta Marcela.
Segundo ela, cursos e diplomas oferecem base teórica, mas não ensinam como lidar com pressão, conflitos ou decisões críticas.
“O RH precisa equilibrar essas duas dimensões, avaliando o que o candidato entrega em termos de comportamento e resultado, e não apenas o que consta no currículo”, afirma.
A opinião de Fernanda vai pelo mesmo caminho: “Acredito que cerca de 70% dos critérios para avaliar candidatos à sucessão de liderança devem estar relacionados a soft e power skills, enquanto os 30% restantes dizem respeito a resultados e histórico de performance”.
Para a Head de T&D da Across, o maior diferencial nos cursos formais está nas experiências de trocas sobre outros contextos e mercados, que ampliam repertório e sustentam decisões com visão além da empresa atual.

“Os líderes do futuro precisam estar preparados para atuarem em ambientes de constante mudança e pressão, capazes de tomar decisões bem fundamentadas e realizar uma gestão ambidestra, antecipando cenários.”
Fernanda Bueno, consultora e Head de T&D da consultoria Across
E Fernanda continua: “As lideranças devem também mobilizar transformações, provocar questionamentos construtivos e engajar de forma autêntica e coerente com a cultura organizacional, pois só assim vão gerar impacto sustentável”.
Diversidade nas lideranças: talentos em uma cultura de inclusão
Ampliar a diversidade entre as lideranças não é uma tarefa simples, ainda mais se for considerado que muitos talentos não vêm de trajetórias acadêmicas tradicionais.
Segundo Fernanda, da Across, o RH tem o papel fundamental de democratizar o acesso à liderança, criando múltiplos caminhos que reconheçam diferentes formas de excelência.
“Nossa experiência prova que quando investimos no potencial humano, independentemente de credenciais tradicionais, criamos organizações mais inovadoras, resilientes e sustentáveis”, diz.
Ela também destaca a importância de dar espaço ao desconhecido e à experimentação em um processo, algo que pode ser visto com cautela em algumas organizações, mas é um caminho promissor para abrir espaço para os altos benefícios que a diversidade oferece.
“Isso começa desde a definição de um perfil de contratação até a definição dos critérios de promoção, os quais – historicamente – carregam muitos vieses inconscientes, que limitam transformações”.
O desenvolvimento de critérios claros de avaliação também é visto como primordial por Marcela, com a remoção e anulação de vieses que favorecem apenas perfis convencionais.
A representante da CNP People Solutions ressalta que programas de mentoring, job rotation e projetos estratégicos podem dar visibilidade a talentos pouco explorados, enquanto uma cultura de inclusão garante que essas pessoas tenham oportunidades reais de crescimento.
“Empresas que insistem em seguir o padrão ‘formação X + experiência Y’ perdem a chance de construir lideranças inovadoras e mais representativas do negócio e da sociedade”, reforça Marcela.
O futuro do desenvolvimento de talentos e sucessão de lideranças
Como será feito o desenvolvimento de talentos e sucessão de lideranças a partir de agora? Fernanda Bueno acredita que muitos avanços estão por vir em relação a formação de gerentes e gestores.
“Especialmente com a empregabilidade da Inteligência Artificial com mais intencionalidade, seja para identificação dos talentos/ sucessores, seja na personalização de trilhas de desenvolvimento, que aceleram o crescimento. Tudo baseado em padrões de comportamento com ajustes real time dos seus progressos”, aponta.
Para a representante da Across, os assistentes e avatares de IA com feedback contínuo e personalizado estão nesse horizonte, em que habilidades tão desafiadoras e importantes “são desenvolvidas em ambiente seguro com simulações extremamente fiéis aos desafios do ambiente de trabalho, como encontros de feedback e conversas difíceis”.
E ela continua: “Outra métrica que precisa urgentemente avançar são os analytics de bem-estar, seja para antecipar padrões de energia, estresse, burnout e até mesmo para apoiar soluções de gestão emocional, saúde mental e equipes em flow”.
Já Marcela Zaidem coloca como ponto chave no desenvolvimento de talentos e da sucessão de lideranças, a orientação pela estratégia do negócio.
Entre as tendência que ganham força, segundo a executiva da CNP People Solutions estão:
- “Decisões de crescimento baseadas em dados e indicadores estratégicos. A área de Pessoas não vai mais trabalhar no achismo. Métricas de performance, engajamento e potencial serão o combustível para identificar quem deve assumir papéis de liderança.”;
- “Liderança construída na prática e na experiência, não apenas em diplomas. Programas internos e exposição a projetos críticos permitirão que talentos desenvolvam habilidades reais de decisão e influência”;
- “Planejamento de sucessão como alavanca de performance e diversidade. A sucessão será estruturada para refletir a pluralidade do negócio, equilibrando habilidades técnicas, comportamentais e representatividade. O RH estratégico cria caminhos claros para todos os talentos que têm potencial, garantindo que a próxima geração de líderes seja capaz de transformar a empresa de dentro para fora”.
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