Gerar soluções para problemas sociais e da comunidade de forma criativa: esse  é o objetivo do empreendedorismo social. O termo de origem francesa, “entrepreneur”, se referia “àquele que está entre, um intermediário”, passando no século 17 a configurar  “a pessoa que assume riscos de lucro e começa algo novo”. No Brasil, foi por volta dos anos 1990 que começaram a surgir uma onda de negócios sociais que se propunham a resolver os diversos problemas existentes no campo socioambiental. A seguir entenda melhor o que significa essa prática.

  1. O que é empreendedorismo social?

Enquanto o empreendedor “comum” cria um negócio para obter lucro, atendendo a uma demanda do mercado, o empreendedor social promove uma iniciativa para resolver um problema, atender uma necessidade social, normalmente percebida em sua comunidade, onde ele vive e ou trabalha. “Tem como foco a comunidade e a resolução de uma questão de ordem humanista ou social, como a prostituição infantil, algum tipo de doença, ações relacionadas a meio ambiente ou algo que tenha impacto na sociedade. Diferentemente do empreendedorismo baseado no conceito “nice to have”, de algo que é legal ou importante ter, o empreendedorismo social tem essa visão de ser legal ou importante, mas com um impacto direto no ambiente da comunidade”, afirma Roberto Kanter, professor de MBA’s da Fundação Getúlio Vargas (FGV), no Rio de Janeiro, e especialista em empreendedorismo. Ele diz ainda “que o lucro existe, mas é para poder gerar mais negócios, expandir a atuação e fazer com que o impacto social seja exponencialmente crescente”.

O empreendedorismo social pode se referir a qualquer iniciativa feita com a intenção de avançar em causas sociais e ambientais, com ou sem fins lucrativos, como por exemplo, o combate à pobreza e a exclusão social, a oferta de serviços em saúde, telemedicina, energias renováveis ou gerenciamento de resíduos,  viabilizando a sustentabilidade de indivíduos, grupos, comunidades e organizações.

Se no inicio, o empreendedorismo social estava muito ligado às organizações sem fins lucrativos ou organizações da sociedade civil, na virada dos anos 2000, o termo ganhou um significado mais amplo. “É uma atividade que tem forte componente inovador e gera valor social, podendo acontecer independentemente do setor – pode ser em uma organização sem fins lucrativos, um negócio social ou setores do governo”, explica Cássio Aoqui, professor de Empreendedorismo Social e Negócios de Impacto da pós-graduação de Gestão Estratégica em Sustentabilidade na  Fundação Instituto de Administração(FIA), em São Paulo.

  1. Qual a função do empreendorismo social?

O empreendedorismo social busca desenvolver programas ou projetos de produto ou serviços que têm impacto direto na sociedade, nas pessoas. Para Cássio, uma das principais funções do empreendedorismo é gerar valor social, para mitigar ou solucionar desafios nas áreas mais diversas como educação, saúde, acesso e tecnologia, de forma inovadora, criativa, que busque escala, abrangência, na sua atuação.

“Uma empresa que desenvolve um novo computador, um novo rádio, uma nova tecnologia, não obrigatoriamente estará desenvolvendo algo que vai impactar a sociedade. Mas quando você desenvolve, por exemplo, uma técnica de melhorar a reciclagem, trabalhar com resíduos, com educação, inclusividade ou na oferta de possibilidades a pessoas que não têm acesso a determinadas questões, isso naturalmente tem um lado voltado ao empreendedorismo social”, complementa Roberto.

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  1. Quais são as características do empreendedor social

Há fatores objetivos e técnicos q caracterizam esse empreendedor. “No geral, são pessoas que têm uma visão de mercado, de como as ferramentas, as técnicas, os modos de gestão podem alavancar suas operações e atividades de impacto social”, relata Cassio. Ele diz que muitos empreendedores sociais não vêm de um ambiente economicista ou gerencialista, mas sim, são médicos, professores ou advogados, por exemplo. Já nas novas gerações há sim cada vez mais empreendedores sociais saindo das escolas de negócios. “Eles trazem um componente mais técnico, de planejar suas atividades, olhar de forma mais estratégica, avaliar, monitorar e mensurar os resultados não só financeiros, mas sobretudo os impactos socioambientais. Esses são os aspectos mais ferramentais desses empreendedores sociais”, comenta o professor da Fia. Além disso, diz, são pessoas muito cativantes, envolventes, que têm uma habilidade de comunicação única. “Eles conseguem, em varias medidas, conversar com os mais diversos públicos, stakeholders (todas as partes interessadas de um projeto), seja de pessoas de alta vulnerabilidade a filantropos ou bilionários que circulam no jet set (grupo de alto poder aquisitivo) internacional. Trazem o componente de inspirar pessoas a seu redor de forma que elas venham a contribuir e mesmo saiam de seus respectivos trabalhos, façam a transição em busca dessa causa maior ou desse propósito que se propõem a resolver”, esclarece Cássio.

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  1. Empreendedorismo empresarial x empreendedorismo social

Enquanto um negocio tradicional foca principalmente na geração de valor econômico-financeiro, atuando sobre a lógica de mercado puro, sendo direcionado à lucratividade e distribuição de dividendos para seus acionistas, o empreendedorismo social prioriza a geração de valor socioambiental, que deve estar, no mínimo, no mesmo nível de importância da geração de valor econômico-financeiro.

Fatores subjetivos como intencionalidade, escala e cadeia de valor variam muito a depender da proposta de empreendedorismo. “No tradicional, pode ser que um empreendimento, por exemplo, crie um aplicativo que gere renda, mas esse não era o principal motivo de sua criação. Já no empreendimento social, essa intencionalidade, de geração de valor socioambiental é central”, afirma Cássio.

Em relação à escala, o professor da Fia explica que empreendedorismo tradicional quer crescer, criar filiais para ampliar o número de consumidores e, por conseguinte, a lucratividade, muitas vezes, gerando patentes e apropriando-se do conhecimento desenvolvido para ter exclusividade. “No empreendedorismo social, falamos de replicabilidade, o negócio não cresce de dentro para fora, ele busca compartilhar conhecimentos ou metodologias para que a solução seja disseminada em diferentes contextos”, diz Cássio.

Quanto à cadeia de valor, a lucratividade, as margens, são o fator central de decisão no empreendedorismo tradicional, enquanto no social, há outras prioridades, por exemplo, de inclusão. O negócio pode criar estratégias de acesso para comunidades em situação de vulnerabilidade, para que sejam incluídas na cadeia de valor, como consumidores, colaboradores ou fornecedores, de maneira integrada.

Cássio ressalta, porém, que não se trata de classificar os negócios em lados opostos. “A meu ver, é impossível simplesmente categorizar as diferentes organizações, sejam empresas, sejam organizações da sociedade civil, em uma ou outra definição – empresarial ou social.”. Para esse professor, deve-se trabalhar numa perspectiva de espectro contínuo, considerando que existem diferentes organizações com funções e objetivos variados. “Há organizações sem fins lucrativos, mas que geram renda por prestação de serviços; negócios de impacto que podem ou não ter fins lucrativos mas com geração de valor social; empresas socialmente responsáveis, voltadas para a geração de lucro em si, mas que têm como atividade central olhar para o socioambiental. Esse espectro é bastante complexo e variado, cada organização pode se situar em algum ponto dessa ‘régua’ e também pode mudar dependendo de seu momento na história”, destaca o acadêmico da Fundação Instituto de Administração.

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  1. Marketing ou preocupação social

Algumas empresas podem usar do marketing para disseminar boas causas e dizer que causam impacto social, mas não necessariamente são coerentes nem têm a robustez necessária para uma transformação social. A preocupação social é a base do empreendedorismo social, é o cerne da sua intencionalidade. O empreendedor ou empreendedora social olha de forma inquieta, criativa e inovadora para preencher lacunas, resolver ou mitigar problemas da sociedade. Um exemplo disso é a escola de idiomas “4for2” (para você também), criada para oferecer aulas de inglês em periferias de São Paulo, com professores estrangeiros a preços acessíveis, com foco nas classe mais desfavorecidas. Outra referência em empreendedorismo social é o Instituto da Criança, com sede no Rio de Janeiro. Organização da sociedade civil de interesse público  (Oscip), o instituto investe em projetos e campanhas de educação, cidadania, geração de renda e desenvolvimento comunitário.

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