Enquanto no meio organizacional – e na sociedade como um todo – a juventude sempre foi associada a inovação, energia, adaptabilidade e domínio tecnológico, os profissionais mais velhos, ao ganharem os primeiros cabelos grisalhos e entrarem na turma dos “enta”, eram colocados de lado.
Havia a ideia que indivíduos com alguns anos de experiência não se interessavam por adquirir novos conhecimentos, tendo resistência às novidades tecnológicas e com uma acentuada queda do vigor, o que resultaria em baixa produtividade.
Assim, esses profissionais deixavam de ser considerados para promoções ou programas de desenvolvimento, eram realocados para funções secundárias, ou pior: eram “convidados a sair”, abrindo lugar para alguém que, no entendimento da liderança, estaria vendendo vitalidade e ideias inovadoras.
Se de uns anos para cá essa interpretação de que idade significava um carimbo de “ultrapassado” começou a ser refutada com veemência, foi porque vieram à tona discussões como o etarismo no ambiente organizacional e a contratação de mão de obra madura.
Mas o preconceito com base na idade ainda está longe de ficar somente no passado. De acordo com a plataforma Catho, em sua pesquisa “Etarismo 2024”, na qual busca reforçar a conscientização e a propagação de oportunidades reais para profissionais acima dos 50 anos no mercado de trabalho, a questão ainda é incômoda e a discussão é completamente válida.
Os principais dados do levantamento são:
- 69% dos profissionais acham que já perderam oportunidades por causa
da idade; - 55% sentem que suas habilidades foram subestimadas;
- 40% dos gestores resistem a contratar profissionais com 50+ anos;
- 61% das empresas não têm nenhuma iniciativa de inclusão ou
desenvolvimento voltada para esse público.
Ou seja, se de um lado o combate ao etarismo está em amplo debate, por outro as práticas excludentes continuam as mesmas de anos atrás, e os gestores de Recursos Humanos devem ter como meta avaliar maneiras de promover oportunidades reais para trabalhadores maduros e apresentarem aos gestores e líderes as contribuições que esses profissionais costumam oferecer.
Mas como fazer essa integração? Para debater esse assunto, convidamos Andrea Tenuta, Head da Maturi, e Sandra Zveibil, consultora de carreira da We4You.
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Principais obstáculos de recolocação dos profissionais 50+
Mais do que se manter em atividade profissional, a recolocação no mercado de trabalho para indivíduos 50+ é muito complicada.
A postura relutante das empresas pode ser observada na pesquisa da Robert Half, feita em parceria com a startup Labora, em que é mostrado que cerca de 70% das empresas contrataram muito pouco ou nenhum profissional com mais de 50 anos nos 24 meses anteriores.
Andrea Tenuta, da Maturi, aponta dois grandes obstáculos enfrentados: dificuldade de se recolocar em novo emprego e falta de oportunidades no desenvolvimento profissional conduzido pelas empresas em detrimento aos “jovens talentos”. Isso se dá por puro preconceito etário, baseado em estereótipos infundados.
Segundo ela, à medida que envelhecem, dentre tantos outros exemplos, as pessoas costumam ser vistas como desconectadas da inovação e da tecnologia, menos curiosas, mais lentas, desatualizadas, mais cautelosas, querendo se manter no mesmo lugar, menos produtivas ou com dificuldades de adaptação a novas culturas organizacionais.
“Além disso, existe a miopia de que são mais pessoas caras, não somente sobre salário, mas também benefícios como assistência médica, ou que possuem baixa flexibilidade, o que nem sempre condiz com a realidade. Esses preconceitos acabam limitando o acesso desses profissionais a entrevistas e oportunidades compatíveis com sua experiência”, afirma Andrea.
Sandra Zveibil, da We4You, também ressalta a questão do menor custo do profissional jovem e do potencial de crescimento na visão organizacional, mas que “ainda está em processo de desenvolvimento de suas competências técnicas e comportamentais e requer mais acompanhamento”.

“Enquanto que os profissionais 50+ muitas vezes são vistos com estereótipos de que custam caro para o mercado, mas que não tem tanta atualização tecnológica, mesmo quando isso não é verdade, acompanhados do mito de que são menos flexíveis a mudanças ou novas culturas organizacionais”, explica Sandra Zveibil, consultora de carreira da We4You
Preconceito etário e o impacto nos profissionais 50+
Antes de ser uma questão organizacional e que afeta escritórios e demais ambientes de trabalho, o etarismo acontece em todas as esferas da vida, estando presente nas relações humanas, entre amigos, familiares, etc.
O preconceito por causa da idade afeta diretamente a autoestima e a saúde mental, pois afinal, receber um tratamento infantilizado, por exemplo, quando se é mais velho, faz com que a pessoa se sinta incapaz.
“Lembrando que o preconceito etário é para todas as idades. Uma pessoas da área da saúde recém-formada não ser considerada pelo fato de ser jovem demais é uma atitude etarista também. Essas pessoas tendem a começar a questionar seu próprio valor, sentem-se invisibilizadas no mercado e, por vezes, acabam internalizando esses estigmas”, aponta Andrea Tenuta.
Sandra Zveibil também segue essa interpretação. Ela afirma que a falta de uma ocupação quando esses profissionais mais maduros estão desempregados gera um forte impacto na autoestima, e consequentemente, na saúde mental.
“Isso acontece pelo sentimento de se sentirem excluídos ou descartáveis no mercado. Pode haver sintomas de ansiedade, depressão e perda de propósito, especialmente quando a carreira sempre foi prioritária”.
Amparado na questão da valorização da saúde mental corporativa, entrou em vigor em maio deste ano – com tempo para ajustes até maio de 2026 – a atualização da NR-1, o conjunto de diretrizes que estabelece as bases para a gestão da segurança e saúde no trabalho (SST).
Essa revisão estabelece que a gestão de riscos psicossociais – fatores no ambiente de trabalho que podem prejudicar a saúde mental e o bem-estar dos colaboradores – deve ser incluída no Programa de Gerenciamento de Riscos das empresas.
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Inclusão de profissionais mais velhos: estamos progredindo?
A diversidade em ambientes organizacionais é um dos debates corporativos mais ativos dos últimos tempos.
Além do público mais velho, essa política de Diversidade, Equidade e Inclusão (DE&I), que busca abrir oportunidades reais de participação e crescimento em empresas plurais culturalmente, foca na diversidade racial, nos PCDs, LGBTQIAPN+ e neurodivergentes, entre outros grupos minoritários.
Mas será que esses esforços têm valido a pena, transformando de modo verdadeiro a cultura organizacional das empresas? Estamos avançando, estagnados ou mesmo regredindo nesse sentido?
Para Andrea Tenuta, o mercado vem avançando na pauta sim. Em ritmo mais lento do que o tema precisa, mas com uma evolução persistente.
Prova disso é o Certified Age Friendly Employer (CAFE) que a Maturi conquistou há dois anos. O programa é liderado pela Age Friendly Institute, uma organização com mais de 17 anos de atuação nos EUA, onde a certificação já possui inclusive apoio governamental.
Esse selo valida as práticas e também se torna um compromisso público de se avançar nas práticas efetivas sobre a inclusão de pessoas 50+.
“De todos os grupos subrepresentados no mercado de trabalho, o público 50+ e o tema de relações intergeracionais ainda é o mais embrionário na grande maioria das organizações. Mas vem ganhando mais conhecimento e ações efetivas”, explica Andrea.
“Falar de diversidade é uma mudança de cultura, portanto, sim, a cultura organizacional é fator crítico de sucesso para que avance a temática. Estamos em um momento de transição, onde há conscientização crescente, mas precisamos de ações mais práticas e mensuráveis para não estagnar”, continua a representante da Maturi.
Sandra Zveibil também entende que esse ainda é um progresso lento dentro das organizações. Segundo ela, apesar de algumas empresas já possuírem vagas específicas para esse público, com discurso sobre inclusão, de fato há poucas políticas estruturadas para combater o etarismo internamente.
“Na prática, poucas empresas adaptam processos seletivos ou modelos de trabalho para os profissionais mais velhos”, alerta a representante da We4You.

Perder profissionais 50+ é abrir de mão de uma contribuição efetiva
Ignorar profissionais experientes em seus processos de Recrutamento e Seleção é um erro recorrente, porém grave, dos recrutadores. E a maioria das empresas não se deu conta disso.
“A maior perda é financeira. Times multigeracionais performam mais, são mais inovadores e dão melhores resultados. Os indicadores de gestão de pessoas como turnover e absenteísmo também melhoram. Ignorar profissionais experientes é desperdiçar um capital humano valioso”, aponta Andrea Tenuta.
Para Sandra Zveibil, esses profissionais mais maduros trazem como aspectos positivos a inteligência emocional, maior responsabilidade, comprometimento, capacidade de adaptação e resiliência.
“Muitos tiveram que aprender muitas tecnologias ao longo de suas carreiras, além de um repertório de vida mais robusto e agregador. Ignorá-los nos processos seletivos pode significar uma perda de conhecimento. Esse público costuma ter maior facilidade para resolver uma crise e tendem a ser mais estáveis”, afirma.
Segundo Andrea Tenuta, da Maturi, esses profissionais são excelentes mentores para as novas gerações.

“Incluir pessoas 50+ em seus times, faz com que consiga ampliar a visão para o mercado consumidor 50+, o famoso mercado prateado. Times de marketing jovens e sem diversidade etária tendem a não considerar o mercado prateado justamente pelo fato de ser muito jovem. Nesse caso tem dinheiro parado na mesa. Não se comunicam e não se relacionam com o público consumidor”, Andrea Tenuta, Head da Maturi.
Práticas de RH para combater o etarismo nas empresas
Que a promoção de uma cultura mais inclusiva passa pelo Recursos Humanos não há dúvidas.
Mas quais práticas são eficazes para combater o etarismo nas empresas, que cada vez mais lidam com equipes compostas por profissionais de várias gerações?
Apesar de reiterar que não existe “receita de bolo”, afinal esse é um processo de mudança de cultura e mindset, Andrea Tenuta pontua que para combater o etarismo são necessárias, por exemplo, ações de sensibilização e instrumentalização especialmente da liderança e RH.
Andrea explica que políticas claras são importantes, mas não funcionam se as pessoas não tiverem repertório, uma vez que treinar e sustentar o aprendizado é fundamental, pois um erro comum das empresas é fazer ações pontuais, como palestra, evento, roda de conversa, mas não darem segmento nesta instrução.
“Ações como vagas afirmativas, treinamentos e programas de desenvolvimento como mentoria intergeracional promovem ações práticas do tema, ajudam a desmistificar estereótipos e criar conexões genuínas entre as diferentes faixas etárias”, ressalta a Head da Maturi.
Já na abordagem do Recrutamento e Seleção, avalia Sandra Zveibil, é importante não pré-determinar a idade para a vaga, e tampouco questionar esta informação durante a entrevista.
“Assim cria-se um alinhamento neste sentido a todos os participantes do processo seletivo dentro da organização, treinando-os a focar nas competências durante a entrevista”.
Desconstruindo preconceitos no ambiente de trabalho
Mas qual seria o melhor modo de começar a promover uma inclusão mais efetiva de profissionais maduros?
Escuta e empatia são as palavras mágicas em um primeiro momento, enfatiza Andrea Tenuta.
Segundo a Head da Maturi, entender as histórias, os desafios e o potencial dos profissionais das diferentes gerações é o primeiro passo para desconstruir preconceitos, uma vez que o papel do RH é fundamental nesse processo, como agente de transformação dentro das organizações.
“A inclusão etária não exige grandes revoluções, mas sim pequenas atitudes diárias que promovem respeito, valorização e oportunidade”, diz.
Em um segundo momento, é preciso observar dados, indicadores para definir o caminho, além de mensurar todas as ações que realizar.
“A diversidade etária enriquece não apenas os resultados, mas também as relações humanas no ambiente de trabalho”, completa Andrea.
Representante da We4You, Sandra Zveibil deixa um recado aos profissionais que estão nesse momento de vida e aos que um dia vão se deparar com essa questão.
“Existem muitas portas, muitas oportunidades interessantes e precisamos parar, pensar, analisar hipóteses, e assim preparar um novo plano de vida e carreira que faça sentido. Busque ajuda se precisar. Para você que ainda é jovem, prepare-se para este momento, financeiramente e emocionalmente”, finaliza.
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