Criada em 1943, durante o governo de Getúlio Vargas, por meio do Decreto-Lei nº 5.452, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), reúne toda a legislação trabalhista vigente no Brasil, garantindo condições justas e dignas para os trabalhadores, na busca de uma harmonia nas relações entre empregadores e empregados.

Durante todas essas décadas, no entanto, esse documento que regulamenta a atividade trabalhista formal no país sofreu diversas alterações para se adaptar às atualizações no mercado de trabalho e na economia. Afinal, o mundo, o país, a tecnologia e o trabalhador mudaram de modo significativo desde então, e é preciso tentar acompanhar essas evoluções. 

E o ano de 2025 começou com algumas novas regras na CLT que tentam traduzir necessidades trabalhistas atuais. Já estão em vigor ou começam a valer ainda este ano novas diretrizes como:

  • Trabalho remoto;
  • Trabalho aos domingos e feriados;
  • Licença-paternidade;
  • Férias;
  • Flexibilização da jornada de trabalho.

Essas reformas prometem maior flexibilidade e o equilíbrio entre produtividade  e qualidade de vida, criando um ambiente de trabalho mais eficiente e justo aos 39 milhões de brasileiros com carteira assinada, segundo números divulgados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (Pnad Contínua).

Para explicar minuciosamente essas mudanças, tanto pelo lado do direito trabalhista, quanto dos impactos à gestão de pessoas das organizações, ouvimos especialistas que garantem que as adaptações precisam ser cuidadosas e bem estruturadas para que todos saiam ganhando.

Bora lá?

O que esperar das novas regras da legislação trabalhista?

As mudanças previstas na CLT para 2025 visam a tornar as regras de contratação mais flexíveis, incentivando a geração de empregos formais. 

São alterações que abrangem desde a flexibilização das jornadas de trabalho até medidas para mitigar riscos à saúde do trabalhador no ambiente laboral.

Thiago ressalta que essas mudanças impactam diretamente a relação entre empregadores e colaboradores, algo que sempre exige adaptação cuidadosa e atualização constante para garantir que as práticas empresariais estejam em conformidade com a legislação, sendo preciso a partir disso:

  • Revisar contratos e políticas internas, adequando-os às novas exigências legais;
  • Capacitar as equipes de RH e jurídicas para mitigar riscos trabalhistas e evitar passivos futuros;
  • Ajustar práticas de negociação coletiva, assegurando alinhamento às novas diretrizes.

“Será preciso também reforçar a conformidade com normas de compliance, especialmente no que se refere à Lei Geral de Proteção de Dados, a LGPD, e segurança do trabalho”, pontua o advogado. 

Trabalho remoto

Modelo de trabalho em que o profissional exerce suas funções fora do ambiente tradicional da empresa, o trabalho remoto se tornou necessário no início da pandemia de Covid-19. 

Com o passar dos anos e o fim das restrições, por diversas razões, muitas organizações mantiveram os profissionais no chamado home office, seja 100% dos dias ou no sistema híbrido, combinando dias presenciais e remotos.

Agora, as novidades da CLT preveem acordos individuais entre empregadores e empregados, que se tornarão necessários para tratar de questões como energia elétrica, internet e outras compensações de despesas.

As empresas terão a responsabilidade de fornecer os equipamentos adequados para o trabalho remoto, como: computadores, cadeiras apropriadas, além de garantir treinamentos sobre saúde e segurança no trabalho. Essas medidas visam a assegurar que o trabalho remoto seja seguro e produtivo.

O advogado Thiago Martins explica que a legislação brasileira já contempla o teletrabalho na CLT, com as alterações introduzidas pela Reforma Trabalhista de 2017 (Lei 13.467/2017). 

“Agora, com o fim da pandemia, muitas organizações estão retornando ao modelo presencial ou híbrido e enfrentando diversos desafios que não estão claramente previstos na legislação, gerando dúvidas e insegurança jurídica”, ressalta.

Para minimizar riscos e garantir segurança jurídica, o advogado recomenda que as empresas:

  • Formalizem o teletrabalho por contrato ou aditivo, detalhando atividades, jornada, infraestrutura e critérios para reembolsos;
  • Implementem diretrizes de ergonomia e segurança, assegurando que os funcionários possuam um ambiente de trabalho adequado;
  • Criem um canal de compliance trabalhista, permitindo que colaboradores relatem dificuldades internamente antes de recorrerem à Justiça.

Segundo Ana Carolina Guerra, especialista em Recursos Humanos e diretora da POP RH, a flexibilidade no formato de trabalho deixou de ser exceção para se tornar uma realidade e o grande desafio para as empresas não é apenas garantir produtividade, mas manter a equipe engajada na cultura organizacional

“Trabalhar à distância pode afastar os colaboradores do convívio com os colegas e da identidade e valores da empresa, e o RH precisa encontrar formas de fortalecer essa conexão”, afirma Ana Carolina.

A especialista em RH coloca a necessidade de “pequenas ações” que fazem diferença, como: encontros presenciais estratégicos, momentos de integração online e até mesmo programas que reforcem os valores da empresa no dia a dia

“Sobre o fornecimento de equipamentos e reembolso de despesas, faz todo sentido que a empresa tenha essa responsabilidade. Para um trabalho remoto eficaz e garantia da saúde e segurança no trabalho, o colaborador precisa de estrutura”.

Trabalho em feriados e domingos

As regras para o trabalho em feriados e domingos também ganham uma atualização em 2025. 

A partir de agora será ampliada a possibilidade de negociação para o trabalho em feriados e domingos, conferindo maior flexibilidade às empresas. No entanto, essa flexibilização dependerá de acordos coletivos firmados com os sindicatos. 

Setores essenciais, como saúde e transporte, continuarão seguindo suas convenções específicas, mas outros segmentos precisarão ajustar suas escalas de trabalho, seja por meio de folgas compensatórias ou pelo pagamento de adicional para quem atuar nesses dias, principalmente aos domingos.

Thiago Martins explica que as empresas que não conseguirem formalizar acordos com os sindicatos, precisarão ajustar as escalas ou arcar com o pagamento de adicionais salariais, o que poderá resultar em aumento de custos operacionais. 

Mudanças na legislação trabalhista

“Além disso, a necessidade de negociação com sindicatos pode gerar impasses e atrasos na implementação de novas regras, tornando essencial que as empresas adotem uma postura proativa na condução dessas discussões. Manter canais de diálogo abertos com as entidades sindicais será fundamental”, aponta o advogado.

Já Ana Carolina explica que a flexibilização das regras para o trabalho em feriados e domingos exige que o RH tenha um olhar mais estratégico sobre escalas e acordos coletivos.

“Esse é um tema sensível, pois afeta diretamente a qualidade de vida dos colaboradores e a atratividade da empresa como marca empregadora”, admite. 

Ainda de acordo com Ana Carolina, o ideal é que as empresas adotem políticas que tragam previsibilidade para os profissionais, garantindo que eles tenham autonomia para planejar suas folgas.

“A negociação de bancos de horas bem estruturados pode ser uma solução eficiente, desde que seja justa para ambas as partes e que seja um benefício autorizado pelo sindicato na convenção coletiva. Além disso, oferecer benefícios como adicionais salariais ou folgas programadas pode ajudar a manter um clima organizacional positivo”.

Licença-paternidade

Uma das alterações mais significativas é a ampliação da licença-paternidade, que passa a ser de 90 dias, permitindo maior participação dos pais nos cuidados iniciais dos filhos.

Essa mudança vem na linha da discussão sobre a nova parentalidade, um tema que tem ganhado destaque nos últimos anos com o reconhecimento de diferentes estruturas familiares, como: uniões homoafetivas, filhos adotivos, famílias anaparentais (grupo familiar sem pais), etc.

“Assim busca-se equilibrar a divisão das responsabilidades familiares e fomentar a maior participação dos pais nos primeiros meses de vida dos filhos. Essa mudança também tem um importante viés de igualdade de gênero, pois visa reduzir a disparidade de tratamento entre homens e mulheres no mercado de trabalho”, comenta Thiago Martins.

Segundo ele, a ampliação da licença-paternidade ajuda a diminuir essa discriminação indireta ao distribuir de forma mais equilibrada os impactos da parentalidade entre ambos os gêneros.

Sobre impactos financeiros por possíveis substituições temporárias, o advogado trabalhista explica que algumas empresas poderão ter acesso a incentivos fiscais caso participem de programas de fomento à parentalidade.

Diante desse cenário, recomenda-se que as organizações avaliem estratégias de redistribuição de tarefas.

Thiago Martins coloca como uma possibilidade as contratações temporárias e implementações de políticas de apoio à parentalidade para minimizar impactos na produtividade, enquanto Ana Carolina vê como uma boa prática investir no desenvolvimento de talentos internos, preparando profissionais para assumirem responsabilidades eventuais quando necessário.

“Essa mudança deve ser vista pelas empresas como uma oportunidade de fortalecer sua cultura, clima organizacional e atratividade no mercado, e não apenas como um desafio”, explica Ana Carolina Guerra. 

Férias

Quanto às férias, a nova medida da CLT permitirá o parcelamento em até três períodos, desde que acordado entre empregado e empregador. 

Com essa alteração, explica Thiago Martins, é permitido que o colaborador usufrua dos dias de descanso de maneira mais adequada às suas necessidades, enquanto a empresa pode organizar melhor sua equipe para evitar impactos operacionais.

No entanto, o parcelamento das férias deve observar algumas regras, como:

  • Um dos períodos deve ter no mínimo 14 dias consecutivos;
  • Os períodos restantes não podem ser inferiores a 5 dias;
  • As férias não podem começar nos dois dias que antecedem feriados ou o descanso semanal remunerado.

Para garantir segurança jurídica e evitar conflitos trabalhistas, Thiago Martins apresenta três dicas:

  • “Formalizar o parcelamento por acordo individual escrito, especificando os períodos e a concordância do trabalhador”;
  • “Registrar adequadamente no sistema de RH, garantindo transparência e conformidade com as regras trabalhistas”;
  • “Realizar um planejamento estratégico, a fim de evitar impactos operacionais negativos, especialmente em setores que dependem de equipes reduzidas”.

Pelo olhar da gestão de pessoas, Ana Carolina coloca que o parcelamento das férias em até três períodos pode ser uma ótima alternativa para algumas empresas e um grande desafio para outras.

“Se bem estruturado, permite mais flexibilidade para os colaboradores e menos impacto na operação. Porém, sem um bom planejamento, gera conflitos de agenda e sobrecarga de trabalho”, argumenta.

“Essa flexibilidade pode ser positiva, mas se não for bem gerida, pode acabar dificultando o planejamento de projetos de longo prazo. Empresas que dependem de times sempre completos para o fluxo de trabalho precisam ter um controle para garantir que não haja períodos críticos sem profissionais disponíveis”, continua a especialista em RH.

Flexibilização da jornada de trabalho 

Regime em que o trabalhador atua por quatro dias consecutivos e folga três dias seguidos, a jornada de trabalho 4×3 é uma reivindicação da classe trabalhadora que tem ganhado eco em vários lugares do mundo, inclusive no Brasil, onde essa movimentação está relacionada, ainda, às discussões pela extinção definitiva da escala semanal 6×1

Em dezembro de 2023, a Comissão de Assuntos Sociais (CAS) aprovou o projeto que inclui na CLT a possibilidade de redução da hora trabalhada diária ou semanal, sem redução da remuneração, desde que feita mediante acordo ou convenção coletiva (PL 1.105/2023). 

Mesmo antes da aprovação do projeto, algumas empresas já implementaram esse modelo de forma experimental. 

“Entendo que a adoção da jornada de quatro dias por semana representa um avanço na busca por maior equilíbrio entre vida pessoal e profissional, mas sua implementação exige planejamento e cautela, pois pode gerar impactos financeiros e operacionais para todas as empresas”, diz Thiago Martins.

Embora setores que operam com atividades ininterruptas, como: saúde, transporte, segurança pública e indústrias, enfrentem desafios mais evidentes, todas as empresas, independentemente do segmento, sentirão os efeitos da mudança

“Para adotar esse novo modelo, as empresas devem formalizar a mudança por meio de acordo individual entre empregado e empregador, respeitando os limites da CLT, ou com um acordo ou convenção coletiva, em setores que exigem ajustes mais específicos para evitar prejuízos à operação”, explica o advogado trabalhista. 

O contrato deve detalhar:

  • Carga horária semanal e sua distribuição;
  • Forma de compensação de horas, caso necessário;
  • Critérios para reversão ao modelo tradicional, se a empresa precisar de ajustes futuros.

“Por fim, a flexibilização da jornada pode gerar conflitos se o banco de horas não for bem administrado. Entre as estratégias para evitar problemas incluem a formalização das regras claras, a definição de critérios transparentes e a implementação de sistemas de controle de jornada, que garantam conformidade legal e evitam disputas trabalhistas”, explica Thiago Martins. 

Já em relação à operação e à cultura organizacional, Ana Carolina Guerra observa que também haverá desafios com a jornada 4×3.

Segundo ela, é um modelo que já está sendo testado em várias partes do mundo e, apesar dos benefícios como mais qualidade de vida e engajamento, exige mudanças na forma de organizar o trabalho internamente.

“Um dos pontos a serem discutidos é a garantia de que a redução de dias não gere uma sobrecarga nas horas restantes ou afete a produtividade da equipe”, alerta a profissional de Recursos Humanos. 

O primeiro passo para o time de RH é mapear quais atividades podem vir a ser afetadas e entender quais processos podem ser otimizados para que essa transição aconteça de forma saudável. A tecnologia pode ser uma grande aliada nesse processo, automatizando tarefas operacionais e permitindo que o foco seja nas atividades estratégicas.

“Também é fundamental envolver as lideranças desde o início, garantindo que elas enxerguem os ganhos do novo formato, evitando que se tornem barreiras ao processo”, afirma Ana Carolina.

Como preparar gestores e lideranças para essas mudanças?

Muitos gestores e lideranças podem ter receio de que algumas dessas novas regras atrapalhem o rendimento das equipes e joguem os resultados lá para baixo. E ganhar o apoio dos líderes é fundamental nesse momento de novidades na CLT.

“O RH precisa atuar diretamente na capacitação dos gestores, para que eles percebam não apenas as regras e impactos, mas também como cada decisão influencia a cultura organizacional”, explica Ana Carolina Guerra.

Segundo ela, muitos gestores ainda têm resistência a mudanças, especialmente quando envolvem maior flexibilidade de trabalho, então é essencial criar espaços de diálogo, oferecer treinamentos e garantir que as lideranças tenham clareza sobre os benefícios dessas transformações.

“No final, qualquer mudança trabalhista reflete diretamente na experiência do colaborador. E empresas que conseguem alinhar suas políticas às novas realidades do mercado tendem a reter mais talentos e fortalecer sua posição como marcas empregadoras de referência”, completa Ana Carolina. 

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